Reúno-me semanalmente com um grupo de pessoas simples em uma pequena cidade de cerca de 1o mil habitantes, chamada Teixeiras. O bairro onde moram é bem pobre e suas casas têm quase sempre vestígios de improviso. Seus moradores, inclusive, estão sofrendo nestes dias porque não têm roupas para afugentar o frio.
Nos reunimos sempre para estudar a vida de Jesus Cristo. Interessante saber que pessoas - na maioria, rejeitadas pela sociedade por serem pobres - podem expressar suas idéias sobre a vida e interpretar textos antigos e difíceis.
Nesta quinta-feira, 15 de junho, lemos juntos um texto que descreve o fato em que Jesus acalma um vendaval que aflingia as pessoas que viajavam no mesmo barco que ele. Falar que Jesus é poderoso e que tem controle sobre a natureza é óbvio diante deste texto. Mas este mesmo texto pode nos ensinar lições preciosas sobre o que é poder e como ele deve ser usado.
Entre perguntas e respostas, refletimos juntos sobre nossos poderes. Concordamos que todos, de uma forma ou de outra, temos poder sobre pessoas e coisas: sobre filhos, empregados, situações, escolhas...
A grande questão é saber como usamos nossos poderes. Resolvemos, então, olhar para o exemplo de Jesus. Ele recebeu poder de Deus "não para ser servido, mas para servir", como relata Marcos 10.43-45. Jesus acalmou a tempestade, não para mostrar seu poder sobre tudo e todos (isso será feito no tempo certo, segundo Fp 2.9-11), mas para fortalecer a fé dos seus amigos ("onde está a sua fé?", ele disse).
Fé e poder estão mais próximos do que imaginamos. Maquiavel dizia em seu famigerado e conhecido "O Príncipe" que os principados eclesiásticos mantém-se porque são sustentados pela "rotina da religião". Disse Maquiavel:
"As suas instituições [dos principados eclesiásticos] tornam-se tão fortes e de tal natureza que sustentam os seus príncipes no poder, vivem e procedem eles bem como entendem. Só estes possuem Estados e não os defendem; só estes possuem súditos que não governam. E os seus Estados, apesar de indefesos, não lhes são arrebatados; os súditos, embora não sejam governados, nã0 cuidam de alijar o príncipe nem o podem fazer. Somente esses principados, portanto, são por natureza, seguros e felizes." (capítulo XI, páragrafo 1).
Claro, Maquiavel estava se referindo aos líderes religiosos do século XVI. Mas talvez possamos pegar emprestada sua reflexão para nos ajudar a analisar as práticas do poder no século XXI.
Dos governantes (políticos ou religiosos) aos simples moradores de um bairro pobre da uma pequeninha cidade mineira... todos precisam aprender a lidar com o poder que têm. Isso é algo urgente!
Jesus nos ensina que o poder só tem sentido se é usado para servir o outro. O poder não deve ser usado para oprimir, auto-glorificar ou construir "castelos de vento". O poder deve ser usado para restabelecer o equilíbrio, proteger o indefeso e estabelecer a justiça.
Para nós, cristãos, a fé que temos deve ser o instrumento harmonizador no uso do poder. Cremos que todo o poder que temos, na verdade, foi dado por Deus, através do Espírito Santo. Atos 1.8 avisou que o poder do Espírito desceria sobre nós para que fôssemos testemunhas de Jesus, "tanto em Jerusalém quanto em Judéia e Samaria, e até os confins da terra". Não é para sermos líderes déspotas e egocêntricos; é para sermos simplesmente testemunhas de alguém que é maior que nós. Testemunha fala e mostra a verdade. Só isso (e tudo isso).
Eu e o grupo de pessoas reunidas naquela fria quinta-feira, terminamos nosso encontro com pequenos sorrisos nos lábios. Parece que havíamos descoberto algo muito precioso. Talvez eles nuncam tenham pensado que possuíam poder. Talvez eu nunca tenha pensado isso até aquele dia.
O sentimento que carregamos conosco, ao final da reunião, foi de que o poder é um presente muito sério e de que se ele for usado corretamente fará muito bem a todos.
sábado, junho 17, 2006
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